O Breve Catecismo de Westminster afirma que o sétimo mandamento “exige a conservação da nossa própria castidade e da do nosso próximo, no coração, nas palavras e no comportamento” (P&R 71). Dito de outro modo, o sétimo mandamento nos chama a mais do que a mera abstenção da atividade sexual fora da união em uma só carne que é o casamento. Também nos chama à pureza sexual no pensamento e nas palavras.
À medida que certas expressões da sexualidade – outrora consideradas tabu – se tornam comuns e à medida que colegas, amigos e até membros da família compartilham notícias de um divórcio sem investigação de culpa,[1] de um relacionamento homossexual ou de uma união estável, mais e mais cristãos – especialmente quando amizades e laços familiares estão em jogo – se sentem impelidos a simpatizar em vez de condenar, a apoiar em vez de se afastar, de afirmar em vez de rejeitar. Contudo, ainda pesa sobre nós a obrigação de lutar com o texto bíblico.
Jesus afirma que, desde o princípio, Deus “os fez homem e mulher […], tornando-se os dois uma só carne”. Alguém qualificado para o presbitério deve ou ser solteiro e casto ou um homem de uma só mulher – o “marido de uma só esposa”. Jesus restaura a dignidade de uma mulher pega em adultério, mas também lhe diz que ela precisa parar de adulterar (João 7.53-8.11). Ele chama os escribas e fariseus para uma aplicação mais profunda e verdadeira do princípio da castidade. Até a luxúria – o ato de fantasiar com mulheres em geral em vez de desejar pactualmente uma mulher em particular – vem de uma imaginação adúltera (Mateus 5.27-30).
Com a pornografia, a cultura do “ficar” e expressões não convencionais da sexualidade se tornando comuns, o clássico ensinamento bíblico está se tornando menos popular em nossos tempos modernos. Contudo, se a verdadeira relevância da Escritura está no fato de que a Escritura não demonstra nenhum interesse em ser relevante – isto é, ela não demonstra nenhum interesse em ser adaptada, revisada ou censurada apenas para acompanhar as novidades do dia –, então a questão sexual é uma com a qual os crentes sinceros devem lidar. Devemos permanecer comprometidos em ser contraculturais sempre que a cultura e a verdade estiverem em conflito uma com a outra. Isso, somente isso, é o que tornará os cristãos verdadeiramente relevantes na cultura.
Jesus, que permaneceu um homem solteiro e celibatário por toda a vida, aprovou o sexo na relação marital entre homem e mulher. Ele inventou o sexo. Sexo não é proibido. Não é tabu. É uma dádiva, um convite ao marido e à mulher para que desfrutem do Éden juntos – nus e sem vergonha, íntimos e abraçados, expostos e não rejeitados. Provérbios convida o marido a encontrar satisfação nos seios da sua esposa. Cantares de Salomão retrata um marido e sua mulher admirando-se e ousadamente desfrutando o corpo nu um do outro. Paulo, também solteiro e celibatário, diz que, exceto para curtos períodos de oração, um marido e uma esposa fisicamente sãos devem entregar-se um ao outro sexualmente. A história culminará na consumação entre Jesus e sua noiva, a igreja – um “grande mistério” que todo crente, casado ou solteiro, pode antever no novo céu e na nova terra. E, contudo, a porneia – a abrangente palavra grega para a imoralidade sexual – representa qualquer afastamento da união marital entre homem e mulher.
Por que a Escritura é aparentemente tão liberal com respeito ao sexo dentro do casamento heterossexual, mas tão limitadora para qualquer outro cenário? Tim Keller diz que isso é porque o sexo é a mais prazerosa e a mais perigosa de todas as faculdades humanas. O sexo se parece muito com o fogo. Pode aquecer, confortar e purificar. Mas, se não for manejado com cuidado, pode também queimar, infectar, escoriar e destruir. Eu vi isso acontecer em inúmeras situações pastorais ao longo dos anos. “Há caminho que ao homem parece direito”, diz o provérbio sagrado, “mas ao cabo dá em caminhos de morte” (Provérbios 14.12).
Sendo assim, qual é o caminho reto nesta questão? Pretendo propor algo fora da caixa. E se nós cristãos, especialmente aqueles de nós que desejam ser sal e luz na cultura, mas que ainda afirmam a antiga visão judaico-cristã para o sexo, ficássemos mais preocupados com a ética sexual bíblica “aqui dentro” do que com aquela “lá fora”?
A sábia e fascinante Madeleine L’Engle nos ajuda com o seu lembrete de que “nós conduzimos pessoas a Cristo […] ao lhes mostrarmos uma luz tão encantadora que elas desejarão, de todo o coração, conhecer a sua fonte”.
A proclamação da luz será um tiro pela culatra onde não houver a demonstração da luz. Em vez de condenar o “sexo na cidade”, e se voltássemos a nossa atenção para sermos e nos tornarmos a “cidade edificada sobre um monte” a qual Jesus deseja que sejamos?
E se afirmássemos que ser solteiro e sexualmente casto (como Paulo e Jesus) é um chamado nobre, frutífero e “muito melhor”? E se começássemos a nos arrepender da casamentolatria, voltando a nossa ênfase para aquele casamento do qual todos os outros são apenas sombra – a união mística entre Jesus e a Noiva, a qual inclui os todos os crentes, maridos e mulheres, mas também viúvos e viúvas, divorciados e outros homens e mulheres não casados? E se focarmos em redimir a sexualidade na igreja primeiro, arrependendo-nos da pornografia, das piadas vulgares, dos comportamentos e vestes imodestos e outros hábitos que objetificam a imagem de Deus? E se nos tornarmos intencionais em reduzir o número de divórcios nos casos em que não há fundamento bíblico e nutrirmos o amor, as conversas demoradas, o andar de mãos dadas, a fidelidade, o perdão, o viver face a face (em intimidade) e também lado a lado (em missão) dentro dos casamentos?
Pois, a menos e até que nos tornemos esse tipo de comunidade contracultural entre nós mesmos, as pessoas “lá fora” farão ouvidos de mercador para todo o nosso zelo pela castidade bíblica. E com razão.
Rev. Scott Sauls é pastor titular da Christ Presbyterian Church em Nashville, Tennessee, EUA, e autor deJesus Outside the Lines: A Way Forward for Those Who Are Tired of Taking Sides. Ele está no Twitter em@ScottSauls.
[1] N.T.: Divórcio sem investigação de culpa (no-fault divorce) se refere à possibilidade jurídica de um cônjuge requerer a dissolução do casamento sem precisar alegar a violação de um dever conjugal (por exemplo, os deveres de fidelidade ou de coabitação) da outra parte. Embora sejam comuns atualmente, legislações que permitem o divórcio sem investigação surgiram no Ocidente apenas na década de 1960.