Desde que minha filha nasceu, eu e minha esposa decidimos mudar o modo como faríamos certas coisas em nossa família. Uma delas foi a maneira de celebrar o Natal. Para que pudéssemos ensinar a pequena de forma mais visual e marcante sobre a encarnação do Verbo, decidimos que montaríamos um presépio (não, isso não é idolatria, caso a ideia passe pela sua mente). Assim, a cada início de dezembro, tiramos um momento para, juntos, montá-lo, enquanto faço uma espécie de teatrinho com os bonecos, para encenar e contar toda a história do nascimento de Jesus (Lucas 1–2.1-20). O resultado tem sido ótimo e a pequena, aos 4 anos, já sabe tudo sobre o assunto: arregala os olhos ao falar sobre Herodes, discorda com veemência quando alguém diz que Papai Noel existe, sabe o que são “estrebaria” e “manjedoura”, entende que os presentes que damos no Natal são uma alusão ao que os sábios deram ao Deus menino… enfim, a ideia pedagógica funcionou muito bem. No início deste ano, viajamos de férias e, ao retornar, ocorreu um episódio bem interessante.
Assim que retornamos, reparamos que o presépio ainda estava montado. Virei-me para minha esposa e lembrei a ela que já chegávamos ao fim de janeiro e, por isso, tínhamos de guardá-lo. Minha filha escutou e perguntou se poderia brincar com os bonecos antes que os puséssemos de volta na caixa. Pensei um pouco e respondi:
– Pode sim, bebê, desde que sua brincadeira seja sobre a história do nascimento de Jesus.
E fui fazer outra coisa qualquer, enquanto vi a pequena começar a segurar os bonecos e falar como se estivesse dando voz aos personagens:
– Maria, eu sou o anjo Gabriel. E, adivinha só: Papai do Céu mandou dizer que você vai ser mamãe…
Fui para meu escritório realizar algumas tarefas e a deixei imersa no teatrinho. Passado algum tempo, percebi que minha filha já não estava mais com o presépio e se entretinha em outra atividade. Em certo momento, me levantei e passei pela sala. Foi quando, de relance, reparei algo interessante: a disposição dos bonecos no cenário da estrebaria tinha mudado. Originalmente, havíamos posto o boneco que representa o menino Jesus na manjedoura, com José e Maria atrás dele, os sábios espalhados por ali, assim como os pastores e os bichinhos (uma ovelha, um cavalo e uma vaca). Um anjo estava posicionado um pouco mais longe. Não havia ordem na disposição dos bonecos, era como se estivessem distribuídos aleatoriamente pelo cenário. Mas, depois que minha filha brincou com o presépio, ela finalizou deixando todos os personagens em roda, voltados com o rosto para o centro do círculo. No meio estava o bonequinho de Jesus e, ao seu lado, também no meio dá roda, o da ovelhinha.
Achei curiosa a disposição e resolvi perguntar a minha filha por que tinha deixado o presépio daquele jeito inusitado. A chamei e pedi que me explicasse. Ao que ela respondeu:
– É que Jesus é o mais importante de todos, por isso ele fica no centro e os outros ficam em volta dele.
Eu sorri. Minha filha não sabia, mas ela tinha acabado de teatralizar um dos conceitos mais importantes da teologia cristã: o cristocentrismo. Isto é, tudo é por Cristo, para Cristo, sobre Cristo. Nada no universo ou na história da humanidade é a respeito da humanidade, mas tudo o que foi, é e será tem a ver com o Deus Filho. Jesus é o centro. Jesus é o foco. Tudo o mais orbita ao seu redor. Todos os olhos devem sempre estar voltados para Cristo, o Autor e Consumador da fé. “Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2.9-11).
Ali percebi que, de algum modo, as conversas, as musiquinhas, os livros e todas as outras maneiras que encontramos para transmitir conceitos e aprendizados cristãos para nossa filhinha lhe deram o entendimento de que Jesus é a pessoa mais importante de todas e que tudo o mais gira ao redor dele. Aos 4 anos, ela já percebeu que ninguém além de Cristo deve estar no centro de tudo. Nem mesmo as pessoas que trazem bens materiais (os magos), nem papai e mamãe, nem pastores… ninguém deve ser priorizado antes de Jesus.
Mas a coisa não parou por aí. O fato de a ovelhinha estar ao lado da pessoa de Jesus, mas dentro do círculo (embora não no centro), me intrigou. Será que minha filha tinha uma visão “ovelhocêntrica”? Detectei que poderia ter um problema. Por isso, perguntei:
– Mas, bebê, se quem está no centro é o mais importante de todos, por que a ovelha também está dentro da roda, ao lado de Jesus?
A resposta foi extraordinariamente bíblica:
– É que Jesus quer a ovelhinha perto para sempre protegê-la, papai.
Percebi que não, a ovelha ter sido posicionada ali não era um problema. Ela, na mente de minha filhinha, não estava no centro, mas, sim, perto daquele ocupava aquele, porque Jesus sempre estaria perto dela para protegê-la. “E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século” (Mt 28.20), garantiu o Mestre. E ela sabe disso, pois lhe ensinamos esta verdade: Papai do Céu sempre está e estará presente em nossa vida, para nos guardar, guiar e proteger. “Se subo aos céus, lá estás; se faço a minha cama no mais profundo abismo, lá estás também; se tomo as asas da alvorada e me detenho nos confins dos mares, ainda lá me haverá de guiar a tua mão, e a tua destra me susterá” (Sl 139.8-9).
E não foi só o conceito da centralidade de Jesus que ficou fixado na mente de minha filha. Percebi, por suas palavras, que ela compreende que, estando ele presente, seu cuidado conosco também sempre nos acompanha. Em termos bíblicos, a pequena sabe que “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações” (Sl 46.1).
A vida com Deus parte de conceitos extremamente fáceis, tão fáceis que até uma criança os entende. Nós é que muitas e muitas vezes dificultamos, criamos barreiras, nos perdemos em eclesiasticismos. O cerne, a essência do evangelho, é extremamente singelo e compreensível. Tanto que minha pequenininha compreendeu em bem pouco tempo que Jesus é o centro de tudo e se relaciona conosco, em proximidade, intimidade e cuidado. Assim, ela já descobriu que devemos amar a Deus sobre todas as coisas, pois ele nos amou primeiro (1Jo 4.19).
Minha oração é que você possa viver e enxergar a pessoa de Cristo e seus atributos como uma criança: com um olhar simples e direto, sem complicações, sem invencionices, sem reinventar a roda. Concentre-se na essência do evangelho e você caminhará sempre ao lado do Senhor de um modo que o agradará. Como minha filha provou, não é preciso ter doutorado em teologia para compreender conceitos fundamentais da fé cristã, como a centralidade do Bom Pastor Jesus, sua onipresença e seu cuidado com as ovelhas que lhe pertencem. Para isso, tudo o que você precisa ter é um coração aberto a aprender as coisas de Deus com a simplicidade de uma criança. “Em verdade vos digo: Quem não receber o reino de Deus como uma criança de maneira nenhuma entrará nele” (Mc 10.15).
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Mauricio Zágari < facebook.com/mauriciozagariescritor >